domingo, 14 de dezembro de 2008
Brasil envia missão para o "coração" da Antártida
Brasileiro em trabalho de campo na Antártida no ano passado, em missão realizada por Brasil, Chile e EUA
Brasileiro em trabalho na Antártida em 2007; missão agora é escavar testemunho de gelo com até 150 metros de profundidade
MARCELO LEITE
enviado especial da Folha de S.Paulo a Punta Arenas (Chile)
A primeira expedição brasileira ao interior da Antártida já retirou mais de 40 metros de cilindros de gelo perto do monte Johns, 2.115 m de altitude, a uma distância de 1.083 km do pólo Sul. Sob os seus pés há uma camada de cerca de um quilômetro e meio de espessura de gelo azul, neve compactada durante séculos e milênios agora exposta pelo vento, que sublima a camada mais superficial e fofa.
Sua missão sobre esse manto de gelo antártico, nunca antes explorado de modo sistemático por equipes brasileiras, é escavar um testemunho de gelo com até 150 metros de profundidade. Os cilindros retirados na vertical guardam muita informação, selada no interior de microbolhas de ar, sobre a atmosfera e o clima da Terra no passado (no caso, nos últimos 400 ou 500 anos).
Nupac/UFRGS
Brasileiro em trabalho de campo na Antártida no ano passado, em missão realizada por Brasil, Chile e EUA
Os quatro pesquisadores voaram até o local num avião bimotor turboélice Twin Otter com esquis.
Jefferson Cardia Simões, Francisco Aquino e Luiz Fernando Magalhães Reis, todos da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), e Marcelo Cataldo, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), aterrissaram às 13h45 (hora de Brasília) de segunda-feira. Os termômetros marcavam -19ºC, mas a sensação térmica era de -25ºC, por força do vento.
Nos próximos dias, a Folha vai acompanhar de perto a expedição, chamada Deserto de Cristal. É a primeira vez que um jornal brasileiro envia repórteres ao interior da Antártida. A reportagem deverá partir de Punta Arenas, extremo sul do Chile, na próxima terça-feira (15), e retornar no dia 29 --a agenda depende, claro da meteorologia notoriamente variável do continente branco.
Na quarta-feira à tarde, falando por telefone (em ligação transmitida diretamente via satélite), Simões informou que a sensação térmica estava na casa dos -30ºC, mas suportável. "O tempo está bom, tivemos três dias de muito sol", disse.
"Em quatro ou cinco dias chegaremos lá [aos 150 metros de escavação]. Só estamos torcendo para não dar nenhuma tempestade." Os cientistas só contam ali com quatro barracas: dormitório, cozinha, banheiro e "laboratório" --aquela sob a qual os cientistas escavam, protegidos do vento.
O monte Johns fica uns 400 km a oeste do acampamento-base que o grupo montou em 30 de novembro junto aos montes Patriot. Ali está também a base da empresa que transportou a equipe de pesquisadores de Punta Arenas (Chile) a Patriot e depois a Johns, onde o quarteto deve permanecer até quinta-feira.
Terra incógnita
A área em estudo, entre os montes Johns e Woolwards, fica numa das regiões menos conhecidas da Antártida. Segundo Simões, uma equipe científica norte-americana a cruzou no início da década de 1960. Alguns chilenos estiveram lá, por períodos breves.
"É um grande deserto de neve e gelo se estendendo por todo horizonte, ou seja, um verdadeiro deserto de cristal", descreve Simões, por e-mail. As conexões de computador também são feitas por meio de telefones transmitido via satélite.
"Mesmo a palavra 'monte' [Johns] é inadequada, pois na verdade só existe um rochedo que atinge 90 metros acima da superfície do gelo. Isso é tudo o que aparece de uma montanha coberta por mais de 1.000 metros de gelo."
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